Com descontinuidade das ciclovias, quem pedala convive com insegurança no trânsito. Parentes em luto temem que motoristas não sejam punidos
ATUALIZADO 19/10/2020 8:45

Embora o Distrito Federal tenha a maior malha cicloviária do Brasil, com 553,95 km de extensão, ciclistas da capital ainda vivem forte insegurança no trânsito. Apenas nessa semana, quatro pessoas que passeavam de bicicleta foram atropeladas no Plano Piloto. Uma delas, Ricardo Campelo Aragão, 58 anos, não resistiu e morreu. Desolada, a família do aposentado agora anseia por justiça.
O ciclista faleceu no último dia 10, após ter sido atropelado na 703 Norte. Uma amiga que pedalava com ele no local, Nádia Bittencourt, 55, sofreu escoriações e passa bem. O motorista do veículo que provocou o acidente estaria em alta velocidade e fugiu sem prestar socorro às vítimas.
Irmã de Ricardo, Ysmine Aragão, 54, relata que ele fazia parte do grupo de ciclismo Passeio Noturno desde 2014 e que pedalar “era sua paixão”. O morador da 409 Norte vivia com a mãe e dois irmãos e tinha uma filha, de 26 anos.
Ysmine conta que, na noite do acidente, Ricardo e Nádia chegaram a cogitar seguir pela faixa de bicicleta, mas, devido à localização da ciclovia, “como era perigoso naquele horário, tiveram medo de assalto e foram pela rua, porque estava sem movimento”. “Só que aí veio esse carro em alta velocidade e atropelou os dois“, lamenta.
Uma vez que a polícia ainda segue sem novas informações em relação ao atropelamento, a família do ciclista teme que o autor não responda pelo crime que cometeu. “O pior é que sabemos que existe uma impunidade. Muitas vezes, a polícia pode até pode pegar, mas a pessoa não fica presa, é liberada”, comenta a irmã de Ricardo.
Revolta
A dor de perder um familiar por atropelamento também é vivida pelos parentes do zelador Francisco de Sales Ferreira de Araújo, 56. Ele foi atingido na L4 Norte, na madrugada de 23 de setembro. O motorista da empresa Piracicabana que cometeu o crime teria deixado o local sem prestar auxílio à vítima.
No dia seguinte, o autor se apresentou na 5ª Delegacia de Polícia (área central) e foi indiciado por homicídio culposo. No entanto, hoje a família pensa se o desfecho poderia ter sido diferente caso o condutor tivesse ficado no local e acionado o socorro.
“Meu pai andava de bicicleta desde sempre. Nesse dia, foi assistir um jogo de futebol e voltava da Vila Planalto pedalando. Como não tinha onde ficar na pista, veio beirando o asfalto”, conta a filha da vítima, Andriely Alves de Araújo, 29.
“O que mais nos revolta é que a pessoa matou e fugiu. A gente perdeu um parente. Se o motorista tivesse ao menos prestado uma ajuda, a situação poderia ser outra. Ele nem chegou a nos procurar, nem para saber como estamos”, completa.
Conhecido como Chicão, a vítima trabalhava na Federação Brasiliense de Tiro Esportivo (FBTE) desde 1992, onde dava apoio aos atiradores nas competições e treinos. Morador da Asa Sul, ele deixa esposa, seis filhos e dois netos.
“Era o meu herói. Deixava de fazer por ele para fazer pelos outros. Muito dedicado à família e ao trabalho”, descreve. “Ele deixou a mãe dele e os irmãos na Paraíba. Então, os familiares não tiveram nem a oportunidade de enterrá-lo”, lamenta Andriely.
Descontinuidade da ciclovia
Segundo a Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob), a malha cicloviária do DF é a maior do país, ultrapassando cidades como São Paulo (535,9 km) e Rio de Janeiro (450 km). As faixas passam por 28 regiões administrativas (RAs). Plano Piloto (119,95 km), Gama (28,73 km) e Taguatinga (8,40 km) são as RAs com maiores trechos.
Metroples.com